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Foto do escritorGeorges Humbert

Crime ambiental não tem fiança?

Atualizado: há 13 minutos

Em tempos de negacionismo da ciência do direito, de processos antidemocráticos e punitivista, prisões sem denúncias, sensacionalismo e extremismo ambientalista e climático, veio a seguinte tese: "crime ambiental é inafiançável".


Não. Cabe, sim, fiança.


Lei de Crimes Ambientais

A Lei de Crimes Ambientais, do ano de 1998, ao trazer em seu bojo os crimes contra a fauna, revogou tacitamente esta disciplina trazida na Lei 5.197 e sua modificação pela Lei 7.653 (que tornou como inafiançável os crimes disciplinados naquela), e, portanto, as penas a serem aplicadas atualmente são as da Lei de Crimes Ambientais, que nada fala em inafiançável.


Por sua vez, há previsão expressa de como calcular a fiança, no Art. 19, que determina que a perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa.


Portanto, nada mais inconstitucional, ilegal e falso do que afirmar que um crime ambiental é inafiançável.


Crime ambiental e insignificância ou bagatela

Outro tema polêmico é o da incidência ou não do princípio da insignificância ou da bagatela penal em crimes ambientais.


A polêmica reside no fato de que o meio ambiente ecologicamente equilibrado, por força do art. 225 da Constituição, tem natureza jurídica de bem ou interesse indisponível, devendo os autores de atos ilícitos e danos reparar e ser responsabilizados nas esferas cabíveis, incluso a penal, a fim de assegurar, às presentes e futuras gerações, o acesso digno aos recursos ambientais essenciais à sadia qualidade de vida.


Por sua vez, segundo Ayres Britto,

"O tema da insignificância penal diz respeito à chamada 'legalidade penal', expressamente positivada como ato-condição da descrição de determinada conduta humana como crime, e, nessa medida, passível de apenamento estatal, tudo conforme a regra que se extrai do inciso XXXIX do art. 5º da CF, literis: 'não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal'. É que a norma criminalizante (seja ela proibitiva, seja impositiva de condutas) opera, ela mesma, como instrumento de calibração entre o poder persecutório-punitivo do Estado e a liberdade individual. A norma legal que descreve o delito e comina a respectiva pena atua por modo necessariamente binário, no sentido de que, se, por um lado, consubstancia o poder estatal de interferência na liberdade individual, também se traduz na garantia de que os eventuais arroubos legislativos de irrazoabilidade e desproporcionalidade se expõem a controle jurisdicional. Donde a política criminal-legislativa do Estado sempre comportar mediação judicial, inclusive quanto ao chamado 'crime de bagatela' ou 'postulado da insignificância penal' da conduta desse ou daquele agente. Com o que o tema da significância penal confirma que o 'devido processo legal' a que se reporta a Constituição Federal no inciso LIII do art. 5º é de ser interpretado como um devido processo legal substantivo ou material. Não meramente formal. (HC 109277, STF)"

Com efeito, no Brasil, para a incidência do princípio da insignificância ou da bagatela, em linhas gerais, o STF delimitou critérios (HC 109231 ? RA, 2ª T., rel. Ricardo Lewandowski, 04.10.2011; HC 91.920-RS, 2ª T., rel. Joaquim Barbosa, 09.02.2010; REsp 1409973 2013/0338817-9 - 25/11/2013):


1. Mínima ofensividade da conduta do agente;

2. Nenhuma periculosidade social da ação; reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; inexpressividade da lesão jurídica provocada.


Resta saber: o meio ambiente pode ser insignificante, do ponto de vista de bem penalmente protegido?


Noutros termos: incidem a bagatela ou a insignificância nos casos de matéria penal? Para parte da doutrina, NÃO, pois todo dano ao meu ambiente é sempre significativo, notadamente por seus efeitos sinergéticos e inter-geracionais.


Contudo, esse aparente conflito pode ser dirimido com a harmonização dos valores em contraposição. Primeiramente porque, a despeito da indisponibilidade do bem ou interesse ambiental, a mesma não é absoluta e nem mesmo pode significar a obrigatória necessidade de persecução penal ambiental, quando ausentes outros requisitos autorizadores desta, que deve ser a última forma de ação do estado.


Tanto que, pelo próprio princípio específico do direito ambiental e diretrizes do art. 225 que versa a matéria na Constituição, o norte a ser seguido é a reparação e restauração do meio ambiente, não a punição ou a indenização. Por estas razões, não somente para o autor, mas para o STF e STJ a bagatela ou insignificância incidem SIM em crimes ambientais.


Vale ressaltar precedente fixado pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Penal 439-1/SP.


No caso em comento, o Ministério Público de São Paulo denunciou o falecido deputado federal Clodovil Hernandes por crime ambiental (artigo 40 da Lei 9.605/98), mas não foi condenado, pois no caso a dimensão do ato ilícito de desmatar e as medidas de reversão revelaram a insignificância e inadequação da tutela penal. Além desse, segundo o informativo 676, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, por maioria de votos, Habeas Corpus (HC 112563) e absolveu um pescador de Santa Catarina que havia sido condenado por crime contra o meio ambiente (contra a fauna) por pescar durante o período de defeso, utilizando-se de rede de pesca fora das especificações do Ibama.


Ele foi flagrado com 12 camarões. É a primeira vez que a Turma aplica o princípio da insignificância (ou bagatela) em crime ambiental.


O pescador, que é assistido pela Defensoria Pública da União (DPU), havia sido condenado a um ano e dois meses de detenção com base no artigo 34, parágrafo único, inciso II, da Lei 9.605/98 (que dispõe sobre as sanções penais e administrativas impostas em caso de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente).


No STJ, confira-se, neste sentido, o AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.263.800 - SC.

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