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Resumo da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas e algumas contribuições

Atualizado: 2 de abr. de 2021

O presidente da República, Jair Bolsonaro, sancionou nesta quinta-feira (1º) a nova lei de licitações de n. 14.133/21, editado na intenção de modernizar as regras vigentes. A proposta, que substitui a Lei das Licitações (Lei 8.666/1993), a Lei do Pregão (Lei 10.520/2002) e o Regime Diferenciado de Contratações (RDC - Lei 12.462/11), cria modalidades de contratação, insere dispositivos no Código Penal para tipificar crimes em licitações, além de exigir seguro-garantia para grandes obras. Um trecho que previa condições especiais em leilões que envolvam empréstimos de agência oficial de organismos internacionais foi vetado, o qual previa que uma autoridade superior poderia autorizar as condições especiais na contratação, mediante despacho, mas o Palácio do Planalto entendeu que a medida contraria o interesse público.

De início vale esclarecer que a nova lei entra em vigor imediatamente. Isto significa que não haverá uma vacatio legis. Contudo, a revogação das normas anteriores sobre licitação e contratos ocorrerá no prazo de 2 anos. Sendo assim, no prazo mencionado, valerão tanto as normas antigas quanto as novas, convivendo validamente, e vigência, efeito e eficácia jurídica simultâneas.


Diversos são os pontos e situações jurídicas que carecem de aprimoramento ou uma digressão doutrinária, para descrição e posterior escorreita interpretação e aplicação da norma, notadamente face a Constituição e a Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, cujas premissas são base para o novo marco de licitações e contratos.

Sem pretensão de detalhar e muito menos de exaurir as questões, ocupamos de identificar alguns elementos que, a nosso sentir, requerem uma atenção mais acurada, a fim de permitir um novo plexo normativo capaz de melhor instrumentalizar o interesse público estatal no processar e firmar negócios jurídicos das mais diversas ordens.


Primeiramente, para evitar confusões quanto a incidência das normas, de rigor a compartimentalização da nova lei em “parte geral”, de incidência uniforme em todo território nacional, e “normas da União Federal”, respeitando a lógica constitucional de repartição de competência concorrente, na espécie, a autonomia dos demais entes, com suas especificidades locais e regionais.

Outro ponto preambular de relevância, mas que não ocorreu, foi a redução ou extinção das normas princípios. Primeiro porque estas já estão postas no art. 37 da Constituição. Depois, porque muitas das normas que se denomina princípio, são, na essência e modal deontológico, verdadeiras regras. Finalmente, porque os princípios tem – não somente neste tema - se revelado campo fértil para incursões e exercícios interpretativos incontroláveis, geradores de insegurança jurídica, verdadeiro caminho para os desvios e desmandos experimentados em notórios e rumorosos casos de processos licitatórios viciados ou contratos indevidamente aditivados, causando prejuízo ao erário, ao funcionamento da administração pública e ao desenvolvimento sustentável do país.

A nova norma também abre um campo de oportunidade para concretizar um sistema de contratação sustentável, seja alocando normas procedimentais que preservem o meio ambiente durante o processo administrativo, com preferência para a forma digital e online de atuação, como da definição de padrões ambientais como critério obrigatórios de qualidade do bem ou serviço e de julgamento das propostas, cabendo, excepcionar essa obrigação quanto se demonstrara inviabilidade técnica ou econômica da exigência.


Já tema das penas de inidoneidade e proibição de contratar, enquanto sanção gravosa, limitadora da concorrência e passível de uso de modo abusivo em detrimento de empreendedores e da administração pública, merecia ser inserido dispositivo que atribua efeito suspensivo automático aos recursos interpostos em face de decisão que aplica tal pena.

A nova norma inova na modalidade de licitação, ao menos quanto aplicável agora de forma geral: o diálogo competitivo. Outrosssim, acertadamente, acaba com o convite, tomada de preço e RDC, este tendo diversos de seus pontos positivos incorporado como regra, não mais como exceção. Frise-se, ainda quanto este aspecto, por relevante, que a natureza do objeto a ser contratado que define o procedimento, não mais o valor envolvido, permitindo uma escolha mais adequada, razoável, proporcional, eficaz e eficiente.

Quanto aos agentes públicos partícipes do certame, além da comissão, foram criadas as figuras jurídicas do "agente de contratação" e da "autoridade superior".

Quanto ao julgamento, foi trazido para a lei geral o do "maior desconto", que valia só Pregão, o da "melhor técnica ou conteúdo artístico", de regra então aplicado para o concurso, mas agora também concorrência, em casos específicos e o do maior retorno econômico, conforme um percentual economizado e remuneração é variável com métrica atinente à eficiência do contrato.

Como já previstos em leis de outros Estados, a exemplo da Bahia, e mesmo no Pregão, agora as fases terão a seguinte ordem:

  1. Preparatória (chamada de fase interna na Lei 8.666/93);

  2. Divulgação do edital de licitação;

  3. Apresentação de propostas e lances, quando for o caso;

  4. Julgamento;

  5. Habilitação;

  6. Recursal;

  7. Homologação.

Houve mudanças e inovação, ainda, quanto a prazos, instrumentos auxiliares, publicidade e sigilo, artigos de luxo, matriz de risco, margem de preferência, modos de disputa, meios alternativos de solução de conflitos e portal nacional.

Em matéria de contratação direta, destaca-se que, para inexigibilidade, não se aplica mais o critério da singularidade do objeto, inserindo-se o da predominância da natureza intelectual do mesmo, sendo acrescidas mais duas hipóteses de inexigibilidade: credenciamento e locação ou a aquisição ou locação de imóveis cujas características de instalações e de localização tornem necessária sua escolha.

Estas e muitas outras questões foram e estão sendo amplamente debatidas em conjunto com os mais capacitados professores do direito administrativo brasileiro, de diversos estados, cujos descritivos dogmáticos certamente proporcionarão um qualificado acervo de contribuições ao necessário e premente novo sistema legal de licitações e contratações públicas que se apresenta.

Por fim, não é demasiado registrar que o texto aprovado estabelece as normas gerais sobre licitação e contratos administrativos que serão aplicadas a toda Administração Pública direta, autárquica e fundacional de todos os entes da Federação (União, Estados, DF e Municípios), incluindo os Fundos Especiais e as Entidades Controladas, mas não impede a edição e nem mesmo revoga as normas específicas dos Estados, Municípios e DF.


Georges Humbert, advogado, consultor e professor, é pós-doutor em direito pela Universidade de Coimbra, doutor e mestre em direito do estado pela PUC-SP e foi membro do grupo de modernização do estado do Governo de Transição da Presidência da República, do comitê técnico de estudos logística e transporte de serviços postais, cargas e encomendas do Programa de Parceria e Investimentos - PPI da Presidência da República e da Comissão de Estudos da Lei de Licitações, do Instituto dos Advogados de São Paulo - IASP.


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