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Foto do escritorGeorges Humbert

Desastre de Mariana: reflexos e reflexões ambientais

O país foi afetado pelo grave desastre ambiental causado pelo rompimento de uma barragem da Samarco no Município de Mariana, em Minas Gerais.


A lama de resíduos tóxicos, com alto grau de concentração de elementos químicos cancerígenos, contaminou e pode matar o Rio Doce, já avançou por diversas áreas de Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia, alcançando o mar.


Manifestações e controvérsias jurídicas

Diversas são as manifestações técnicas, políticas e jurídicas sobre as duvidosas causas e consequências desta tragédia. A Presidente da República, por exemplo, de logo se arvorou em anunciar a imposição de uma multa milionária à empresa.


Noticia-se a ocultação de documentos e falhas em licenças e auditorias. As informações sugerem danos irreversíveis ou de difícil reparação, demandando décadas de esforços para recuperação.

Há, ainda, informações segundo as quais os danos causados podem ser irreversíveis ou de difícil reparação, mas já há a certeza que serão necessárias décadas para se tentar superar esse grave sinistro ambiental.



De tudo que vem sendo noticiado, entendemos que reflexos e reflexões precisam nortear, de logo e com resultados propositivos, as ações do Poder Público, das instituições e dos cidadãos.


Impactos ambientais e humanos no desastre de Mariana

Em um primeiro plano, ao ensejo dos reflexos não podemos nos furtar a noção de que, a despeito da relevância do aspecto natural e ecossistemas, no caso não se pode olvidar que o impacto ambiental se estendeu às variáveis humanas (para alguns artificiais) e culturais essa, diga-se é uma questão comum aos danos ao meio ambiente, mas nem sempre adequadamente tratada.


Com efeito, além dos prejuízos à fauna, flora, aos recursos hídricos e outros bens ambientais de igual estirpe, a necessidade de reconstrução e relocação das pessoas atingidas à moradia, escola, saneamento e acesso a outros equipamentos e serviços públicos essenciais à sadia e digna qualidade de vida, não podem ficar em segundo plano.


Como não pode também ser desprezado o elo cultural destas pessoas com os locais atingidos, mantendo-se suas tradições, história, costumes e vocações.


Isto não é uma questão lateral ou subsidiária, mas sim uma obrigação constitucional como parte integrante do próprio conteúdo jurídico da expressão "meio ambiente ecologicamente equilibrado" (art. 225) e do princípio normativo da sustentabilidade, na sua equação de soma entre social, econômico e ecológico (arts. 6°, 170, 225 e outros).


Reflexões sobre gestão ambiental

Demais disso, lançamos as seguintes reflexões: o problema ambiental, no Brasil e no mundo, não é derivado das leis ou dos instrumentos, mas da má aplicação destes.


E nem se resolve via poder de polícia, disciplinar ou sancionador (multas, prisão, embargos, licenciamento).



Ora, a partir do princípio jurídico da preservação e proteção ambiental (art. 225), impõe-se a todos sob a jurisdição brasileira agir sempre baseado nas regras de prevenção e da precaução, sendo esta uma qualificação do dever de eficiência (art. 37) que deve nortear a administração pública.


Assim, não podemos admitir ações que não sejam planejadas, açodadas, aleatórias, ou posteriores aos danos ambientais.


Com estes pressupostos, deve-se entender por prevenção a norma de direito ambiental que atrai para ordem jurídica da tutela do meio ambiente o valor que importa a todos, especialmente ao Poder Público, o dever agir de modo prévio, com controle, fiscalização, exigência de estudos, medidas mitigadoras de impacto, compensação, ao se decidir o exercício de atividades ou empreendimentos potencialmente causadores de degradação do meio ambiente.


Ocorre que, por estes pressupostos e para evitar ou minimizar riscos e impactos ambientais, devemos, sobretudo, dispor onde podem e devem ser realizadas determinadas atividades e empreendimentos, mediante ato normativo, do legislativo e, quando necessário, ato regulamentar do executivo, em caráter geral e abstrato, em detrimento do casuísmo e improviso que é a nossa realidade aqui vivenciada.


O desastre de Mariana poderia ter sido evitado

Para impedir ou diminuir as chances de ocorrências trágicas como a de Mariana, já é de rigor possuir leis nacional, regional (estaduais) e local (municipais), indicando as áreas em que atividades e projetos de risco (como mineração, nucleares, de energia, portos, aeroportos, polos químicos e petroquímicos, entre outras), conforme repartição de competências constitucionais (art. 23, 24 e 30).


Ilustramos com exemplos relacionados ao caso concreto.


Em vez de determinar a contenção dos danos via a determinação à Samarco de execução imediata de barreiras e resgate de fauna, flora e de outros elementos integrantes do bioma atingido, a postura da União, via Presidente da República e Ibama, foi lavrar uma multa estrondosa, que em nada colabora para preservar e proteger o meio ambiente.


Em vez de se verificar se os sistemas de controle e monitoramento falharam e abrir um processo administrativo para apurar se houve culpa de agentes públicos ou falta de infraestrutura de fiscalização.


Em vez de se falar na necessidade de planos nacionais de ordenação e zoneamento de atividades potencialmente causadoras de significativo impacto ambiental, já se quer tornar mais burocrático, ineficiente e ainda mais moroso o licenciamento e as avaliações de impacto ambiental.


Assim, não há que se falar em danos e reparação exclusivas aos ecossistemas, que não insiram em mesmo grau o aspecto ambiental humano (ou artificial) e cultural.


Ademais, e em remate, parece-nos que, por mais uma vez, as medidas repressivas e/ou isoladas, ganham protagonismo, em detrimento do dever de programação, planejamento e antecipação de diretrizes em matéria da nossa gestão ambiental, em flagrante ofensa ao princípio jurídico da preservação e proteção ambiental, associado ao da eficiência, o que, além de não resolver essa relevante questão e permitir a melhor tutela ambiental, pode ensejar responsabilidade do agente público, inclusive por ato (comissivo ou omissivo) de improbidade administrativa.


Medidas repressivas e multas não bastam para proteger o meio ambiente. Planejamento, gestão eficiente e antecipação de riscos são indispensáveis para prevenir novas tragédias. O desastre de Mariana é um chamado à responsabilidade e à preservação ambiental.

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